EDUCAÇÃO FÍSICA DO PROFESSOR WILLIAM PEREIRA

Este blog é a continuação de um anterior criado pelo Professor William( http://wilpersilva.blogspot.com/) que contém em seus arquivos uma infinidades de conteúdos que podem ser aproveitados para pesquisa e esta disponível na internet, como também outro Blog o 80 AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA (http://educacaofisica80aulas.blogspot.com/ ) que são conteúdos aplicados pelo Professor no seu cotidiano escolar.

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

EDUCAÇÃO FÍSICA: SABEDORIA DE VIVER - POR SILVINO SANTIN

EDUCAÇÃO FÍSICA: SABEDORIA DE VIVER 
*Silvino Santin

A área da Educação Física transformou-se nos últimos anos num grande fórum de debates, em que se busca descer às raízes das questões que dizem respeito às atividades por ela englobadas. Pode-se afirmar, sem medo de errar, que todos esses debates e questionamentos passam por uma crise de identidade que pode ser resumida pela discussão da legitimidade do próprio nome Educação Física. De fato, os questionamentos de muitos profissionais da área revelam claramente profundas preocupações quanto ao significado em relação ao individuo, à escola e a sociedade. Congressos, Seminários, Simpósios e Encontros multiplicam-se em toda parte buscando definir funções, conceitos e competências da Educação Física e de seus profissionais. Esta efervescência sem dúvida, além de demonstrar uma grande vitalidade, acentua a importância para os destinos do Setor.A literatura, que documentou esses primeiros debates, registra um consenso geral de denuncias a subserviência da área e o baixo nível de consciência política e social de seus profissionais. Chegou-se a afirmar que, para a Educação Física, o homem não possui cabeça, mas apenas, membros e tronco. Aos poucos, porém, denunciar e desmascarar desvios e alienações tornou-se um lugar comum cansativo e, até certo ponto, estéril. Continuar martelando que a Educação Física foi inspirada em exercícios e práticas militares e que continua voltada exclusivamente para o esporte de alto rendimento não resolvia o problema, não superava deficiências e não corrigia desvios. Era preciso formular questões mais substantivas, capazes de sugerir outras alternativas e de definir novas competências. Neste momento, o espírito demolidor das denuncias começou a ceder lugar ao trabalho paciente das reflexões construtivas.Dentro deste novo panorama os debates, estudos e pesquisas dirigem sua atenção para temas de ordem filosófica, antropológica, psicológica, cultural e social. A introdução destes novos ingredientes, de um lado, tornou os debates mais ricos e profundos, de outro lado, porém, gerou uma atmosfera de conflitos. As denuncias pareciam gozar de unanimidade. A nova Reflexão fez surgir posições ideológicas de diferentes matizes. Numa tentativa de identificar a situação pode-se hoje, com bastante segurança definir três tendências, não excludentes entre si, mas que podem traças rumos diferentes para a Educação Física.
a) TENDÊNCIA DA CIENTIFICIDADE
Há um grupo, bastante expressivo e bem determinado de pesquisadores que sonham com a Educação Física como uma ciência autônoma. Eles defendem, no fundo, o ideal do novo espírito cientifico proposto pelos não-positivistas contemporâneos. Para este grupo, a Educação Física e seu profissional só serão respeitados quando a Educação Física for reconhecida pela comunidade dos cientistas como uma ciência especifica.. Enquanto isso não acontece ficará numa posição subalterna e mesmo de desprezo. Para alguns, de inspiração mais filosófica, isto acontecerá quando se puder falar num estatuto epistemológico próprio, que poderia ser a ciência da motricidade humana. Para outros a Educação Física garantiria sua identidade cientifica vinculando-se a padrões de saúde, ou seja, às possibilidades de desenvolvimento orgânico perfeito. Com laboratórios bem equipados, aliados a uma alimentação adequada e a exercícios físicos dirigidos e controlados tecnicamente, seria possível fornecer a base cientifica das atividades especificas da Educação Física. Em resumo, pretende-se colocar a ciência como critério supremo da validade da Educação Física.
b) TENDÊNCIA PROFISSIONALIZANTE
Um grupo, talvez o mais numeroso, luta por uma Educação Física definida como uma atividade profissional liberal. O profissional da Educação Física, segundo esta tendência, deve ser equiparado ao bacharel em direito, ao médico, ao economista, etc. Somente assim a Educação Física seria reconhecida, garantindo-se uma fatia no mercado de trabalho e via legislação, assegurando-se a reserva deste mercado. Suas lutas, fundamentalmente, voltam-se para a política de organização profissional e institucional da classe tentando estabelecer uma legislação federal que dê suporte jurídico aos direitos profissionais fundamentais dos egressos dos Cursos de Educação Física.
c) TENDÊNCIA EDUCACIONAL
Há, por fim, um terceiro grupo, talvez menor e sonhador, inspirado em temas humanísticos que busca entender a Educação Física com uma ação pedagógica. Antes de se tornar ciência, antes d constituir-se em profissão liberal, a Educação Física é uma sabedoria de viver, uma exigência pessoal e existencial, isto é, uma tarefa educativa. Desta maneira, ela, em suas raízes mais profundas, tem compromisso com a pessoa, isto é, com o crescimento, desenvolvimento e bem-estar do ser humano. Ela é um processo educativo que, antes do saber cientifico e do trabalho produtivo, tem um compromisso com a existência humana.
Defende-se, aqui, o ideal pedagógico da Educação Física por considerá-la uma ação mais abrangente, compromissada com a globalidade das situações humanas. Diante disto é necessário considerar alguns pontos, tanto em relação às ciências, quanto em relação ao trabalho profissional. A ciência, em primeiro lugar, não é uma tábua de salvação, nem infalível, nem geral. Se o fosse, há muito tempo a humanidade teria resolvido seus cruciais problemas. Pergunta-se, hoje, se a solução cientifica de alguns problemas não se deu à custa de introdução de um numero maior de problemas. É bom lembrar que os modelos lógico-matemáticos das ciências exatas são incapazes de tratar corretamente os fatos humanos. Neste sentido Horkheimer é muito claro quando diz que “ a denuncia de tudo quanto mutila a espécie humana e impede sua felicidade nasce da confiança do homem(...). Se quisermos verdadeiramente emancipar o homem do medo e da dor, então a denuncia do que hoje se chama razão e ciência é o melhor serviço que a razão pode prestar” (In. Marilena Chauí, Cultura e Democracia). A visão profissional , em segundo lugar, encara o mundo como um mercado de trabalho a ser disputado por concorrentes, não em nome do homem, mas de princípios lucrativos e de interesses econômicos. E quando se tem uma ótica de mercado facilmente tudo se reduz mercadoria. O próprio trabalho não é uma ação criadora, mas uma força produtiva negociável. E o negocio engloba tudo dentro da perspectivas de produtividade e lucro. Toda ação pedagógica por sua vez, vê na ciência um conjunto de recursos possíveis de serem utilizados, não importa sua origem e vê na atividade profissional apenas uma possível meta a ser alcançada no processo educacional humano. O que importa é inspirar-se na multiplicidade das manifestações do ser humano, não apenas nos dados científicos a respeito dele. (Ás vezes tais dados são negações do humano). O que importa é proporcionar a todo ser humano as melhores condições de realizações, não apenas dentro de certas atividades determinadas por um sistema de trabalho produtivo estabelecido pelas leis do mercado, mas a partir de seus desejos e aspirações.Apresentar a Educação Física como uma ação educativa, diante das ideologias da cientificidade positivista e do trabalho produtivo, torna-se uma tarefa quase desesperadora. Para muitos ela não passa de uma posição ingênua, merecedora de um sorriso de compaixão ou de indiferença. É um desafio que acredita nesta afirmação de Satre: “o homem está condenado a cada instante a inventar o homem”. ( O Existencialismo é um Humanismo pg. 254). É por essa invenção de si mesmo que o homem se torna o verdadeiro sujeito da história, e não quando se limita a executar vontades divinas ou a ser levado pelas correntes irreversíveis das dialéticas de materialismo absolutistas.Falar de Educação Física como uma atividade educativa implica defender a idéia da totalidade do ser humano. Não apenas como uma totalidade individual, mas como totalidade social. Não se trata de somar partes, até hoje antropologicamente separadas, nem perseguir modelos a priori definidos, mas embrenhar-se no desconhecido para viver, e, vivendo, fazer emergir a imagem de cada ser humano.
A Educação Física torna-se o lugar próprio da aprendizagem constante de viver, ou seja, uma sabedoria de viver. Cada um de nós precisa aprender a viver através da leitura do livro da vida, que se inicia pela descoberta da linguagem da corporeidade. È uma linguagem que, usando uma expressão de Merleau-Ponty, faz parte da linguagem indireta e das vozes do silencio. É preciso interpretá-la. As necessidades, os desejos, as emoções e os sentimentos constituem a base de ser código lingüístico. Mas como determinar o valor de um sentimento? Como responder a uma necessidade? A fome nem sempre quer uma resposta alimentar. Ela pode ser uma voz da ansiedade. O dialogo que cada um instaurar nada mais é que sua própria existência.É dentro deste contexto que se pode perceber a delicada tarefa educativa da Educação Física. Mais que de cientista, TÉCNICOS ou profissionais, ela reclama por educadores que falem a linguagem da corporeidade humana. Estes não falam em nome da ciências, mas do ser humano. O educador não ocupa o lugar do outro, nem treina, nem doutrina. Ele deixa o outro viver, e deixa surgir os espaços da liberdade criativa.Há, porém, um perigo na medida que surgem aqueles que por uma compreensão equivocada do educar ou por vício do hábito, pretendem impor o pensamento verdadeiro e único, da mesma maneira como outrora transmitiam gestos precisos para o arremesso, corrida ou saltos. Deste modo, o treinador transformou-se em doutrinador de ideologias dogmáticas. A ação educativa reconhece em cada pessoa um construtor de idéias. O ser humano cria utopias, sonha, inventa e constrói mundos. O ser humano pensante não se limita aos quadros mentais fechados de uma ideologia, ele se abre em questionamentos, também não reduz seus movimentos aos passos monótonos da marcha unida, aos gestos padronizados das academias. O ser humano pensante faz do pensar e do movimento a fonte de expressão, da invenção e da criação, o que fará de sua existência, não um autômato ou um robô, mas uma obra de arte. E toda obra de arte é criada para ser contemplada, sentida e vivida.
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*Silvino Santin é professor da Universidade Federal de Santa Maria. RS.



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